quinta-feira, 8 de março de 2012

As Rebeldes Tecelãs






Capítulo 1 – As Rebeldes Tecelãs 






Eram 4 horas da manhã. 


Marie ainda sentia as dores do dia anterior. Tomou um gole rápido de seu amargo café e dividiu um pedaço de pão entre seus dois filhos.


Quando percebeu que o pão já estava começando a embolorar, salivou para dentro uma angustia sem fim. Sabia que aquele era o único alimento que tinha na dispensa, e assim torceu para que fosse o suficiente para dar o mínimo de sustentação para as crianças ao longo do dia. Marie não tinha opção, era o pão ou nada.


Brenda seguia os movimentos de seu braço com uma face compenetrada, e o pequeno John, com os olhos impessoais e frios, movia-se em direção à cama improvisada montada ao lado de um velho sofá, doado no ano anterior por uma família vizinha que mudou-se para o Texas. 


As associações dos moradores de bairro eram um dos poucos grupos que ainda se importavam com os pobres e mais necessitados. Enquanto o governo virava as costas para os eleitores das regiões mais afastadas, para piorar a situação, o clima não era o dos mais favoráveis nos céus da cidade. As chuvas do ano anterior castigaram impiedosamente Nova York. 


As enchentes foram rigorosamente catastróficas. Casas foram derrubadas pela força das chuvas, ruas ficaram alagadas, rios transbordaram, e as reminiscências do último ano eram as mais assustadoras. Toda vez que Marie se lembrava dos temporais passados, maior era a sua certeza de que nunca existiu piedade nos céus de Manhattan.


O fim do inverno de 1857 estava consumindo todas as economias da família Payton. A necessidade de comprar novas roupas, com dinheiro escasso e alimentar duas crianças era um desafio para Marie. 


Após a morte do Alan no ano anterior, Marie Payton teve que aceitar o trabalho em uma tecelagem em Manhattan que pagava uma ninharia para consumir 14 horas de seu dia, sem receber férias, tampouco qualquer outro tipo de direito trabalhista. 


Marie vivia encurralada em seu mundo de trabalho e sem espaço para sonhos e aspirações futuras. Seu maior subterfúgio era pensar em suas crianças.


Marie sentia enorme prazer ao estar sempre agarrada com seus dois filhos. Deliciava-se ao ouvir a voz de seu filho mais novo, John, que há poucos dias começara a balbuciar suas primeiras sentenças. A voz de John ainda era trêmula, mas ao formar a junção de suas palavras iniciais, John transformava os dias de Marie um pouco mais esperançosos.


A fábrica tinha sido reformada há poucos meses. Antes, era um amontoado de ferro velho, cercado por muros e chefes machistas. Os muros e chefes continuavam por lá, mas o antigo barracão foi desativado e na frente foi construída uma nova instalação, que mesmo após ter sido reinaugurada apresentava diversos problemas de insalubridade.


Uma grande chaminé fazia com que o ar fosse expelido e deixasse o ambiente um pouco mais respirável. Mas as reclamações devido ao mau cheiro e as péssimas condições de trabalho eram frequentes e não havia superior que não soubesse disso. 


O único homem que fazia a ponte entre as reivindicações femininas e a direção da fábrica era Dimas White, o gerente de produção. Mas Dimas estava com a mãe muito enferma, e segundo as más línguas, Dimas já viajou para Jersey sabendo da morte da mãe.


Os demais líderes da fábrica, ao invés de se importarem, toda sexta-feira recebiam seus cheques gordos, e saíam no horário do almoço para regressarem a propriedade de suas famílias: fazendas, sítios com lagos privativos, casas de camping e veraneio e toda a ostentação que poderia ser consumida em meados do século XIX.


Um dia esses homens seriam donos de todos os pequenos dotes deixados por seus pais e avós. 

A maior parte do quadro masculino da empresa têxtil era formada por homens que trabalhavam apenas porque era inadmissível um homem de respeito não ter função para exercer. Se fosse no interior, eles teriam que dar duro no campo, mas como estavam em uma cidade com uma franca expansão, eram obrigados à praticar algum tipo de desempenho braçal. As famílias ainda não tinham a cultura de mandar seus filhos para a escola. Achavam que a melhor lição que seus filhos poderiam aprender estava ligada à um dia extenuante de trabalho.


Marie e as outras operárias tecelãs tinham que suportar a jornada de catorze giros do ponteiro durante seis dias da semana e, muitas delas, já não aguentavam mais.


Marine Stwart, uma grande amiga de Marie dos tempos de escola rural, estava conversando com algumas outras garotas para dar um basta nesta situação. Sua principal aliada era Ruth Barker.


Ruth era uma solteirona sem vícios, amigos externos, e sem brilho. Aos oito anos, tinha uma relação cordial com seu padrasto, homem no qual sempre acreditou ser um cara íntegro e confiável. 


Enquanto sua mãe estava no Mercado Municipal, uma tarde o homem veio com uma conversa estranha aos ouvidos de Ruth.


Convidou Ruth para ajudá-lo na escolha de suas roupas. Dissera que tinha uma entrevista de emprego na segunda-feira e que não podia estar deselegante. Ruth, mais do que ninguém, sabia que seu padrasto necessitava da vaga. 


Aos 11 anos, Ruth debutava uma sensualidade retraída. Deixara para trás os desenhos de corpo de criança, e um pequeno seio aflorava no centro de seu corpo; Quando se virava, uma pequena montanha, ainda tímida, também se apresentava. Não era bela, mas indubitavelmente, teria um corpo languido e atraente quando o tempo a desvendasse mulher.


Mas quando Ruth chegou à porta do quarto, notou que algo estava fora de sua órbita. O padrasto pediu para que ela entrasse sem bater. Quando ultrapassou a porta de madeira de lei, sentiu o vento passar por suas costelas e escutou o baque da batida. A porta estava cerrada.


Seu padrasto a encarou com voracidade e foi então que Ruth percebera que estava em uma situação de risco. O homem avançou em direção ao corpo da menina, e com apenas 11 anos, Ruth sentiu o dissabor de ser violentada.


Quanto mais as mãos sujas e precipitadas do homem avançavam, mais era o desapego de Ruth, que tentou gritar, mas como percebeu que sua voz ecoava em vão, apenas rezou para que tudo acabasse logo.


O Mercado Municipal estava apinhado, e a senhora Eva Campbell – mãe de Ruth – , resolveu comprar somente o que era básico e necessário. Pretendia fazer um jantar especial para comemorar o terceiro ano de seu segundo casamento. 


Após a morte do pai de Ruth, o seu atual marido, Julian E. Campbell vinha sendo o maior motivo de orgulho por sua dedicação e apreço por sua filha. Eva ficava encantada com o apego que Julian tinha com Ruth. Parecia que a menina tinha sangue Campbell correndo nas veias.


Quando passou pela cozinha, Eva ouviu um grito gutural vindo do quarto. Com o susto, pensou em chamar alguém na rua, mas como percebeu que o grito era intermitente, começou a ficar com medo do que poderia ver pela frente.


O som aumentava a cada segundo e Eva sentia um tormento a gelar suas mãos. Sem pestanejar, correu para espiar a cena que imaginava que fitaria no quarto, já pronta para aceitar uma cena de traição.


Mas foi um gemido abafado que mudou o panorama daquela cena para Eva.


Eva viu a filha sendo forçada a abrir as pernas e desprezou cada imagem do que via.


Como quem vê uma fruta estragada na feira e passa para a próxima barraca em busca de um fruto novo, Eva ignorou os pedidos de socorro de Ruth, que percebera na mãe a última chance de escapar com dignidade.


Chorando e escorrendo as lágrimas em um sujo pano de prato, Eva Campbell preparou o melhor jantar para seu admirável Julian.


Quando os gritos se esgotaram, Julian saiu do quarto em direção ao banheiro. Lavou-se e após se sentir limpo jantou feliz na mesa com Eva.


Ruth Backer foi dormir na casa de uma tia em Nova Orleans. 


Naquela noite abandonara a família e toda a vontade de dormir com homens. Agora, Ruth precisava acertar a conta com essa corja que tanto odiou durante a vida.


Enquanto Ruth liderava as reivindicações, as tecelãs da fábrica de Nova York desejavam ter aumentos em seus ordenados para pelo menos à metade do que os homens recebiam. Hoje, cada garota que trabalha catorze horas diárias recebe menos que um terço que um trabalhador que urina em pé. Algumas trabalhadoras chegam a receber um cheque de apenas 25% o salário de um cara que desempenha a mesma tarefa.


Pediam também a ruptura da escravatura não declarada, ou seja, queriam ter banheiros mais limpos, menos exploração e xingamentos constrangedores, e definitivamente, sonhavam todos os dias em ter mais do que oito horas para dividir entre cuidar da casa, dos filhos e, se sobrasse um tempo, de encostar a cabeça exausta no travesseiro e dormir.


Marie fez todas as suas responsabilidades matinais e saiu para a fábrica. Foi marcada uma reunião extraordinária às cinco da manhã em frente ao portão principal de acesso à tecelagem.


Faltando três minutos para as cinco, avistou Marine e Ruth a frente das outras 130 tecelãs, que pontualmente estavam no lugar marcado.


Beijou Ruth e Marine e pediu apressadas desculpas, pois sua mãe não chegou a tempo para cuidar de seus dois filhos, o que a impossibilitou de estar um pouco antes para ajudar a distribuir os panfletos e lenços rosa, que foram feitos às escondidas com retalhos de produção descartada.


- Não tem problema, Marie – Interrompeu Ruth. Ainda temos que dar ajuda a todas as meninas. Temos que aprontar tudo antes das seis horas, quando eles começam a chegar.


- Ruth, hoje vai dar certo? Não acha que isso pode ser perigoso?


- Deixa de ser boba, Marie, antes do final do dia vamos conseguir um acordo. Eles não vão querer que 130 tecelãs deixem a fábrica na mão justamente agora que a produção de verão começa a acelerar e os cortes após a temporada de inverno já passaram.


- Tudo bem, Marine, vou acreditar que você tem razão. – Mas dentro de seu peito, Marie não tinha assim tanta fé. Sabia dos métodos dos vigias, principalmente do mais intimidador deles, o Carrasco.


Ton Parker, era o dejeto perfeito de ser humano. Bêbado e sem moral, vivia de se aproveitar das garotas. Sempre estava atento às que faziam corpo mole, sendo muito eficiente ao delatar as meninas que descansavam durante a longa jornada.


Com seu corpo ereto e esguio, Ton era uma figura intimidadora. Ao longo dos seus 1,90m, esbanjava adiposidade. A banha se espalhava pelos membros e se enviesava para a barriga, um amontoado de dobras e pelos que davam ânsia quando sua camisa se erguia ao fazer qualquer movimento mais brusco. O bigode era espesso e a barba era falha e rala. As orelhas de abano pareciam asas aptas para um voo rasante. Seus olhos mantinham a cor vermelha, e esta coloração era resultado de dias, tardes e noites de bebedeira descarrilada. 


Quando criança Ton sofrera com abusos de um tio do interior. O pai não acreditava na história e toda vez que tom vinha reclamar, era Ton que tomava uma surra punitiva. Mas quando o garoto adquiriu tamanho para encarar o tio olhando nos olhos, foi o tio de Ton quem sofreu. Numa tarde amena de outono, o tio de Ton, Anthony Parker, estava sentado em sua cadeira de balanço, já contemplando a calmaria do dia e a brisa da tarde. Ton, que a muito já saíra de casa, deu a volta pela propriedade do tio e ficou na espreita observando o velho. Foi até o matadouro abandonado e encontrou ao lado do amolador, uma faca recém afiada. Tirou-a da prateleira de barro e segurou o cabo como quem segura o último copo de água distribuído na imensidão de um deserto. Caminhou sem fazer ruído. Sua tia Eleonora estava a cochilar e aquele não era momento de por nada a perder. Quando avistou novamente o tio, Ton se encheu de excitação. Não demorou até que seu braço direito fizesse um movimento traiçoeiro por trás do velho. Deu o primeiro golpe na altura do pescoço (mas não o degolou). Foi frio o suficiente para ver o sangue jorrando e ainda sim poder dar o golpe de misericórdia. Uma punhalada certeira no peito. Após o último ato, tom pegou seu chapéu, alinhou-o até sentir-se confortável e saiu da propriedade. 


Depois daquela tarde, Ton Parker jamais voltara ao sul do país. 


Ton era louco por Marie, mas Marie dia após dia se esquivava. Já tinha chutado tanto o meio de suas pernas que Marie custava a acreditar que Ton tinha realmente algo entre as duas coxas. Da última vez, na semana passada, quase foi pega de surpresa no banheiro de acesso ao refeitório, mas com a ajuda de uma novata e de Marine foi salva antes que o Carrasco Ton a levasse mais para dentro do apertado vestiário feminino.


Quando os primeiros trabalhadores chegaram, pouco mudou, exceto o tradicional riso de soslaio que era de se esperar de cada homem que se apresentava para bater o ponto manual.


Quando Arthur Foster, o jovem assistente irlandês chegou à fábrica têxtil, já sabia muito bem o que deveria ser feito. Apressadamente, Arthur mandou um mensageiro ao senhor Paul e, em menos de quinze minutos, a entrada da tecelagem já estava repleta de guardas, todos ao comando de Ton Parker.


As garotas entraram na tecelagem e se organizaram fazendo um cordão humano em frente ao galpão principal. Tinham uma primeira exigência: falar com o dono da fábrica, o senhor Paul Harvey. 


Mas o senhor Harvey não queria conversa. Estava num mau dia. 


Na noite anterior, Isabella, sua mulher troféu, tinha pedido para que Paul desse o melhor lance em um evento beneficente na Igreja Presbiteriana que frequentavam todos os domingos. 


Ao espalhar a notícia no centro de uma mesa, em pleno jantar, Paul não tinha alternativa. Quando terminou de comer, quis estrangular a fabulosa esposa. 


Nem mesmo seu corpo todo desenhado e escultural, nem seu cabelo loiro cuidado e devidamente preso em um lindo chapéu, nem mesmo seus olhos azuis e brilhantes foram capazes de amenizar a ira de Paul.


Mas Paul cumpriu a promessa e doou cinquenta mil dólares por uma pequena pedra de diamante, que no pescoço de Isabella logo teve ágil de uns trezentos por cento. 


Paul deu carta branca para Ton, que liderou uma fileira de homens a avançar rumo ao portão. 


Mas Ruth tinha um trunfo na manga. Ao perceber o avanço dos guardas, começou a colocar seu plano em prática.


Levantou a voz e colocou o corpo de Marine a frente das outras garotas.


Ergueu os braços, serrou os punhos e todas as meninas colocaram os lenços rosa em seus pescoços. Neste momento, Marie sentiu um frio ainda maior no seu corpo. 


Marine estava grávida, e sua barriga estava muito evidente. Não havia como os homens continuarem naquela marcha sem antes ouvirem o que o grupo feminino tinha para dizer.


Marine olhou firme ao horizonte, e os homens estavam a menos de cinco metros de sua visão, mas mesmo assim não teve medo. Podia sentir o cheiro de rum e gim que era marcante pelas manhãs. Os poros daqueles porcos eram como um alambique em plena produção.


Ruth olhou para Marine e deu o aval para que ela falasse pelo grupo. Marie segurou forte na mão de Ruth enquanto suave frio.


De fora, por trás do portão o senhor Paul apenas ouviu Marine começar o discurso:


- Eu tenho 23 anos e estou indo para minha segunda gravidez. Todos os dias, eu acordo às cinco da manhã, dou comida para minha linda Charllote, e isso quando encontro um pedaço de pão. Quando não, pego um pouco de trigo e misturo dentro de uma caneca de água. A pobrezinha quase não consegue beber, mas faço com que ela entenda que tem que comer para o seu melhor. Ela quase chora, mas toma tudo. Muito forte a minha gigante Charllote. 


Marine respirou fundo, segurou as lágrimas e assim continuou:


- Ao chegar aqui, todo dia rigorosamente às seis da manhã, tenho que trabalhar mais de duas vezes o que é digno a uma mulher. Sinto dores, minha gravidez não é tão simples assim. Tive complicações quando estava com seis meses e agora mal consigo andar. Mas não me acovardo. Toda manhã, sigo até as oito da noite nessa merda de fábrica que tanto amo. É daqui que consigo esquecer a dor de ter perdido um amor para vida toda, que foi levado a menos de dois meses por essa peste cinzenta que já matou tanta gente em nossa cidade.


Embargou a voz. Era difícil para Marine pensar na vida sem seu amigo e companheiro. 


- Não temos banheiro limpo, nosso chão é imundo, se não fosse por nossa organização e dedicação não teria como entrar em nosso vestiário. Vocês já viram a condição que está aquilo? Não, não viram nada! Não viram que somos excelentes tecelãs, que temos uma ótima capacidade de inventar, de sermos eficazes e eficientes. Mas nunca olham para nós como seres humanos. Para vocês, somos objeto de desejo e prazer, como esse filho da puta aqui da frente faz com tantas amigas nossas. Não é isso senhor Ton? (Ton foi levemente segurado pelo braço por outro guarda antes que avançasse no pescoço de Marine). 


Nem mesmo a mais otimista das tecelãs imaginava que Marine teria tanta coragem assim para desafiar todos aqueles malditos.


Marie sentia um alívio por Marine ter dito tudo que sempre sentiu, mas que jamais teria coragem de expressar com tanta proeza. 


O senhor Paul jamais fora tão insultado. Alguns curiosos começaram a olhar para fábrica e davam risadas da cara dos operários. Paul sentiu mais fúria com Marine do que com Isabella, que tinha rasgado seu dinheiro na noite anterior.


Deu um recado a Arthur e virou novamente as costas. Aquilo ficaria feio demais para ser espectador.


Artur, esbaforido e sem acreditar nas palavras, fitou Ton e apenas repassou o recado:


- Ton, o senhor Paul quer que você acabe logo com isso. Ele não se importa mais com essas vadias, você está no comando a partir de agora.


Aquilo era um cântico de sereia aos ouvidos de Ton. Um carrasco, com liberdade total de agir logo após ser insultado e ultrajado em frente de todos os seus colegas de labuta.


Ton cuspiu no chão e jogou seu chapéu longe.


Fixou o olhar em Marine, e ambos perceberam em silêncio a ira sincera que cobria a retina de cada um. 


Abruptamente, Ton correu em direção ao corpo de Marine. Sem embargo, deu um soco violento em seu estômago. Eclodia na tecelagem um grito histérico. 


As mulheres estavam em choque. 


Como poderia alguém ser tão imperdoável e insensível? Marie não tinha essa resposta.


Num lance de desespero, Ruth não teve dúvidas e jogou seu corpo sobre Ton. Tentou esmurrá-lo pelas costas. 


Rapidamente, Ton se desvencilhou de Ruth. Sorriu ao ver Marine e Ruth no chão. Sua gargalhada era estridente e alta o suficiente para intimidar todas as trabalhadoras.


Pela primeira vez, Marie foi capaz de sentir a mais pura cólera que alguém pode sentir. Virou-se em busca de socorro e avistou algo que poderia ser útil.


Ao lado da pia de conservação, observou uma barra enferrujada de metal. Segurou-a na mão direita e mirou apenas o carrasco. Seguiu em frente, atropelando suas próprias pernas. Golpeou Ton, e desta vez com tanta força que obteve muito mais sucesso que Ruth. Sem piedade, deu outro golpe certeiro na cabeça de Ton, que ainda chegou a traçar as pernas antes de cair. 


Os outros homens ficaram assustados, mas a revolta feminina tinha que ser repreendida. E foi Arthur que prolongou o campo da batalha. Vendo a fúria de Marie, pegou um pedaço de madeira e acendeu a ponta com um pouco de fogo que saia de uma das caldeiras da chaminé. 


Com o basto de madeira na mão, Arthur arremessou-se contra Marie, mas a tecelã estava com o sangue fervendo, e seus reflexos estavam cada vez mais rápidos. Sua defesa foi brilhante.


Ton cambaleava, mas ainda não tinha perdido os sentidos. Teve tempo de dar uma última ordem antes de desmaiar:


- Andem seus idiotas, peguem suas armas e queimem essas putas!


As tecelãs também tentaram ir em direção às madeiras e ao fogo, mas três homens protegeram os troncos enquanto os que estavam atrás faziam suas armas. As garotas foram obrigadas a se refugiarem para dentro do galpão. Enquanto Ruth carregava Marine, Marie organizava cada uma delas para que não se machucassem.


Arthur andava de um lado para o outro em busca de uma vadia. Era impressionante, mas uma histeria coletiva transformara um simples e burocrata assistente em um fiel escudeiro de guerra, que via na queda do líder a oportunidade de tomar o comando da batalha e liquidar o adversário impiedosamente.


Sangue começava a se misturar com tinta, e não era mais possível ter pena de mais ninguém. Uma simples reivindicação trabalhista acabara de virar uma disputa campal.


Dois grandes amigos de Ton, os irmãos Ben e Richard Burn pensaram em acurralar as tecelãs rebeldes dentro do segundo galpão da fábrica, que já estava abandonado e tinha mesmo que ser demolido. Pensaram apenas em unir o útil ao agradável. 


Percorreram toda a extensão da fábrica. Deram a volta no galpão principal até chegarem à porta que estava desativada. Era uma porta de metal comprimido, com pequenas travas de aço e um pequeno ladrilho no rodapé.


Removeram o ladrilho e tiraram as travas de aço que bloqueavam a porta, e sem serem vistos pelas rebeldes, cada um puxou um dos lados até que as tecelãs conseguissem avistar uma nova saída. 


Atrás dos dois, em silêncio se espreitavam cerca de quinze homens com pedras, paus e tochas nas mãos.


Quando Marie saiu em disparado, não houve tempo de retorno.


Sem perceber, as tecelãs correram para uma arapuca improvisada. Ao saírem do galpão principal, Ben e Richard puxavam as garotas pelos cabelos. 


Não havia embaraço. Cada mulher que se projetava para fora era jogada de qualquer jeito em direção ao velho barraco. 


Os quinze homens se tornaram uns duzentos e logo metade deles estava coagindo as tecelãs em dois flancos.


Em nenhum momento houve constrangimento por parte dos trabalhadores em maltratar as garotas. Nunca existiu lastro entre homens e mulheres na fábrica. 


A maioria das meninas não era de Nova York. Os homens, pelo contrário, eram todos da região. Os tecelões e ajudantes de produção jamais toleraram a participação das forasteiras no chão da fábrica. 


Em um ambiente hostil, todos os dias eram comuns atritos e desinteligências. Como eram duronas, as mulheres não deixavam margem à menor chance para romances ou flertes com os caras da tecelagem. O passar dos dias aumentava ainda mais a animosidade do ambiente.


A vingança contra a rejeição começava enfim a ser colocada em prática. Os corpos ficavam pelo chão e uma agremiação humilde de trabalhadores recebia de forma inconteste a promoção para se tornar um grupo de extermínio.


Marie não sentia pena de mais ninguém. Enquanto pensava na alegre Brenda e no esperançoso John, tinha certeza que só um milagre a tiraria de lá para vê-los de novo.


Arthur, Ben e Richard conseguiram colocar todas as revoltadas dentro do velho casarão, Marie tentou arrebentar a porta, mas não teve êxito algum. Quase quebrou a ponta de dois dedos, mas já não sentia dor. Em um canto do galpão, Ruth e Marine se abraçavam enquanto tinham um choro orgulhoso no canto dos olhos.


Ben e seu irmão subiram no teto, e antes de alcançar o topo do prédio jogaram duas tochas sobre o teto de palha.


Marie começava a sentir o cheiro de fumaça, mas enquanto o espaço não fosse invadido, ainda tinha força para lutar e ser mulher. Abraçou Ruth, deu um beijo demorado na barriga de Marine e começou a esboçar a canção que cantavam sempre quando estavam a todo vapor na tecelagem:






“Sou uma nobre tecelã,


Acordo cedo de manhã.


Dou duro na minha batalha,


Mas não me entrego à canalha.






Sou mãe e filha de respeito


Só tenho amor dentro do peito,


Mas nesse mundo sem fronteiras


Sou a mais nobre das guerreiras”.






E enquanto a canção aumentava o tom, o corpo das tecelãs de Nova York virava cinzas para ser cremado na história da humanidade como um dos crimes mais brutais que já existiram. 


Em 1910, o mundo inteiro reconheceu o dia 08 de Março como o Dia Internacional das Mulheres em homenagem a Marine Stwart, Ruth Backer , Marie Payton e todas as 130 mulheres que lutaram até o fim ao som da Canção das Rebeldes Tecelãs. Mas esse reconhecimento só foi possível devido à história de luta de um homem, John Willian Payton.










Capitulo 2 - Articulações na Mansão Harvey










Paul se despiu às pressas.


Tinha certeza de que fizera a escolha correta. A cidade pertencia à sua família, e as autoridades não causariam problemas. Era o próprio Paul uma autoridade de respeito. Quando saiu da sala, direcionou-se à cozinha em busca de um copo de água. Sorveu o primeiro gole, sereno. Ainda podia ouvir os primeiros gritos femininos ao se afastar da tecelagem. Deitou-se sobre o sofá e esticou as pernas na mesinha central. Apressadamente terminou com a água e foi em busca de algo realmente digno. Queria o melhor whisky da estante. Encheu até a borda. Voltou ao sofá e enfim pode relaxar. A água apenas salivou as impurezas de sua alma. Agora estava em um terreno mais fértil, bebia o líquido dos deuses e queria apenas um pouco de paz para pensar nas decisões duras que teria que tomar. Primeiro: o que fazer com as denúncias que recairiam sobre seus ombros?; Como limpar toda a sujeira depois de tanto sangue derramado?; E, por fim, o quê fazer com Ton e sua trupe? Iria crucificá-lo e entregá-lo a polícia? Ou daria um sumiço com ele para evitar possíveis transtornos? Começou a defender a segunda alternativa. Ton era perigoso demais para estar solto e ser um inimigo a essa altura do campeonato. Era melhor manter a cautela. Iria deixá-lo em alguma propriedade. Esconderia Ton no sul país, daria um aumento gordo e concederia uma promoção simbólica para alimentar o ego do estúpido carrasco. Ton representava o trabalho sujo, a repressão aos trabalhadores, o executor de assassinatos à inocentes, um presente para os inimigos de Paul. Definitivamente Ton era importante demais para ficar magoado com Paul.Pensou em David. Chegara o momento de executar uma operação abafa.


Colocou uma roupa mais leve e decidiu que era hora de entrar em ação.


Chamou um mensageiro e apanhou um pedaço de papel. Usou a pena para escrever um breve recado. Ordenou ao garoto para que entregasse a carta o mais rápido possível ao seu irmão, David Harvey, dono da Folha de Nova York. Teriam que omitir verdades sobre o que acontecera na manhã deste caótico dia. Lembrou-se também do Delegado Duncan. Tinha que ter a garantia de que nada iria sujar o nome de sua família. A lei sempre esteve ao lado dos Harvey, e não seria uma pequena fogueirinha nos fundos de sua fábrica que tiraria o sono de Paul.


- Anda moleque, e aproveita e manda esse recado aqui também para o Delegado Dick Duncan.


- Certo senhor Paul, vou fazer isso o mais rápido possível.


E o menino saiu desesperado rumo à redação do jornal.


Meia hora depois, uma carruagem pomposa estacionava em frente aos portões da Mansão dos Harvey.


David desceu e já estava acompanhado do oficial Duncan. 


- Boa tarde, Paul.


- David, que bom que veio.


- Boa tarde senhor Paul, em que posso ajudá-lo?


- É um enorme prazer recebê-lo novamente aqui, Sr. Duncan. – Mas Paul sabia que o que sustentava as visitas do oficial eram os sacos polpudos de dinheiro que enviava mensalmente à delegacia metropolitana. Não era prazer algum sustentar um policial corrupto e sedento por mais doações amistosas a cada mês. Mas cada esquina de Nova York tinha um preço e Paul sabia a tabela de cada uma delas.


- Senhores, temos um grande problema. Minha tecelagem foi brutalmente saqueada. Minhas garotas entraram em transe e simplesmente queimaram tudo lá dentro. Não satisfeitas, fizeram uma espécie de ritual macabro, se suicidando em um ato coletivo de desespero e abandono total do amor pela vida, pela moral e pela família cristã. Onde já se viu? Mulheres trabalhadoras que queimam o próprio corpo? Meus homens estão chocados e não sei se poderão voltar ao trabalho depois de tanta insanidade em um mesmo lugar.


David segurou o riso no canto da boca. Sabia que o policial Dick estava com o olhar fixo em Paul e pode relaxar um pouco mais.


- Mas que barbaridade, Sr. Paul!


- Pois é, meu caro Dick. Acho que essa cidade está enlouquecendo e literalmente queimando o amor próprio.


- O que devemos fazer, Sr. Paul? A polícia de Nova York estará inteiramente disposta em ajudá-lo no que for preciso. – Dick já podia imaginar o tilintar das moedas em seu bolso para gastar na próxima sexta até o último centavo.


Paul percebeu o jubilo no olhar de Dick e tentou disfarçar sua excitação também.


- Então, chamei os senhores aqui para pedir ajuda total nesse imbróglio. Tenho certeza que meu irmão David irá apurar minuciosamente os fatos com sua equipe talentosíssima. Criei um grupo interno também para levantar cada detalhe dos acontecimentos dessa manhã e terei a maior atenção com cada órgão que necessitar periciar o local. Os bombeiros sairão de lá em torno de uma hora e será nesse momento que voltarei para tecelagem. Prometo voltar para casa somente quando o último parente das vítimas for acalentado. Quero que todos sejam bem assistidos.


A verdade era que após virar as costas para o conflito, Paul não tinha ciência do real tamanho do estrago que deixaram. Quando foi dito a ele tudo que se passara enquanto abandonou a frente do portão, ficou com um frio incontrolável na espinha. Voltou a tecelagem para repassar com toda a equipe de segurança os planos para que todos os trabalhadores falassem a mesma língua. Era impensável deixar rastros para dúvidas. O que ocorrera na tecelagem fora apenas um acidente. Todos deveriam acreditar nessa mentira e repeti-la com convicção, até que se ela seja uma verdade indubitável.


O Delegado Dick Duncan acordou tudo com Paul. Deram as mãos em um pacto bastante robusto para ambas as partes. 


Paul acompanhou o policial até a saída e sentou-se novamente no sofá. Agora seu irmão David estava ao seu lado.


David respirou profundamente e colocou a mão esquerda sobre o joelho de seu irmão.


- Bem, meu caro irmão, acho que estamos em uma enrascada das mais complicadas.


- Sei disso. Agora temos que agir. E nossa ação tem que ser rápida, antes que eles nos devorem.


- Tem razão... Mas que loucura foi essa que aconteceu? Como você pôde deixar a fábrica nas mãos daquele lunático?


- Eu sei, eu sei... Errei feio. Meu gerente de produção está de licença. Sua mãe morreu e ele foi visitar seus familiares. Não poderia pensar que algo tão catastrófico aconteceria em um momento desses. Quando o gerente Dimas não está naquela tecelagem é Ton Parker que toma conta de tudo. Ao seu jeito, é claro. Mas nunca tencionei que ele perderia tanto o controle.


Dimas White era o porto seguro das tecelãs. O único motivo para que o motim da manhã do dia oito de março não acontecesse todos os dias. A revelia de Ton, Dimas conversava com as trabalhadoras e nutria respeitosa simpatia por Marie, Marine e Ruth.


Pelo bom senso de todos, amanhã até o meio-dia Dimas tinha que estar de volta à tecelagem.


David e Paul voltaram a conversar amistosamente e alinharem todos os detalhes da versão dos fatos.


Logo mais David voltaria para a redação da Folha de Nova York, soltaria às pressas uma edição especial cobrindo os fatos da forma mais protetora à família Harvey.


Um grande motim de trabalhadoras sem honra teria eclodido na tecelagem, e tudo terminou com um ritual demoníaco de autoflagelação e sofrimento. As rebeldes tiraram a própria vida em um acidente durante uma reunião estranha durante o longo período de descanso entre o horário do almoço e o retorno ao turno da tarde. Uma explosão aconteceu durante esse ritual. Alguns trabalhadores do sexo masculino confirmaram a versão. Na tecelagem o clima era o de mais profundo pesar pela morte das tecelãs.


Era uma história mística, sem pé nem cabeça, mas a Folha de Nova York era o jornal mais vendido na cidade. Poderia não ser o maior, mas era o mais popular.


Se o plano de Paul e David for bem executado, amanhã, o número de moradores da cidade que acordarão execrando as tecelãs será muito superior aos que desconfiarão da estapafúrdia história.


Os irmãos Harvey deram um abraço amistoso e David saiu da propriedade ciente de que teria que fazer um bom trabalho.


Paul voltou para dentro de sua propriedade e notou que sua esposa Isabella não tinha dado sinais de vida. Perguntou a um dos criados o paradeiro da mulher, mas ninguém soube informar ao certo.


Quinze minutos depois, quando Paul já começava a ficar aflito, um cocheiro negro e alto estacionou o seu cavalo e Isabella Harvey, primorosa, desceu com cuidado da charrete.


Paul notou que o olhar da esposa era de precipitação e sabia que algum anúncio estava por vir.


- Teremos um filho, meu bem!


- Como assim? – O choque que Paul levara apagou o senso crítico e prático da concepção de um filho.


- Ora, Paul, da mesma forma que todo mundo tem crianças. Primeiro uma noite de amor, depois nove meses carregando o bebê no ventre, essas coisas. A diferença é que eu tenho só mais oito meses de gestação.


Paul iniciava assim o entendimento nas palavras de sua esposa.


Depois de um ligeiro estado de choque, Paul abraçou Isabella sem deixar que a esposa respirasse. Isabella sentiu a pulsação de seu marido, mas estava perdendo o fôlego. Paul a soltou e correu para o bar novamente e pegou uma boa bebida para comemorarem.


Pelo olhar de Isabella, Paul dava graças a Deus por perceber que sua esposa ainda não sabia de nada que ocorrera na tecelagem. 


Para o bem do herdeiro Harvey, era melhor que Isabella não conhecesse de forma tão abrupta as barbaridades que se sucederam nesta manhã.


Isabella estava ainda mais radiante. Tinha certeza de que era um menino. Paul não podia ter melhor notícia. Decidiram o nome: Ethan.


Mas enquanto Ethan Harvey não nascesse Paul ainda teria que limpar muita sujeira.


Paul rapidamente riscou de sua mente a possibilidade de dizer toda a verdade a Isabella, mas como já estava atrasado para voltar à tecelagem, apenas avisou que há poucos instantes tinha recebido uma mensagem de que um pequeno desentendimento entre as tecelãs ocorrera pela manhã. Para não ser tão ausente, como o bom diretor que era, tinha que impor novamente a ordem, ainda mais agora que estava sem Dimas White, seu maior interlocutor lá dentro. 


Isabella não ficou muito contente com os argumentos de Paul, mas sabia que os negócios sempre foram a prioridade para Paul.


Deu um beijo na testa do marido e ajeitou a gravata e a cartola. Como fora ao médico pela manhã, Paul aproveitou a ausência da esposa para usar apenas chapéu, o que já começava a ser proeminente na Europa. Mas Isabella achava extremamente deselegante um homem nobre e importante como Paul sair apenas com um chapéu, mesmo sendo de tecido italiano.


Paul nivelou sua cartola e enfim rumou a tecelagem.


Ao chegar ao pátio da fábrica, Paul finalmente teve uma dimensão maior de todos os acontecimentos. Eram policiais que carregavam os corpos das vítimas e não médicos e peritos, conforme orientações do Delegado Dick Duncan. Segundo o policial, em casos de perturbação a ordem pública, nada como a experiência do corpo de policiais de Nova York para cuidar melhor de cada vítima.


Duncan sobre costurar com maestria a situação, e mais uma vez estava ele a frente da imprensa, dando um relato de tudo que observara nos galpões chamuscados de Paul.


- Senhores, o caso de hoje foi bastante grave, mas a população de Nova York pode ficar bastante sossegada. Existiu aqui um ritual doentio por parte de quase cento e trinta tecelãs. Essas moças insanas premeditaram o ato desta manhã. Agiram à surdina e quando os responsáveis pela fábrica tomaram conhecimento dos fatos, o estrago já era absoluto. Graças ao empenho dos trabalhadores e de nossos homens da corporação, o caos não foi ainda maior. Conseguimos chegar a tempo para evitar a destruição completa deste lugar. Se puderem observar, a ala frontal da tecelagem continua intocável, pois quando foi descoberta a ação das lunáticas tecelãs, alguns trabalhadores tentaram evitar uma catástrofe, arriscando a própria vida em prol dos demais colegas de profissão. Paralelamente a essa ação, alguns homens nos procuraram, e nossos primeiros oficiais chegaram prontamente e, com maestria, não deixaram que o pânico tomasse conta deste ambiente. Foi uma ação rápida, que teve o eficiente apoio do corpo de bombeiros da cidade.


Os jornalistas escreviam com a maior voracidade e Paul quase teve um orgasmo ao ouvir a declaração do Delegado Duncan. Definitivamente o homem deveria ser muito bem recompensado.


Mais confiante, Paul se afastou dos jornalistas evitando que fosse visto e tivesse que dar alguma entrevista justamente agora.


Ultrapassou a área proibida, e saiu à procura de Ton Parker, o maior responsável pelos inconvenientes da manhã, e Arthur Foster, o jovem assistente irlandês.












































































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